quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

A "nova" estratégia para as bicicletas em Lisboa?

FIGURA CML (vídeo do projecto "Local Lisbon" online, aos 52´).
O Jornal "Público" notícía que estaria em curso uma "nova estratégia para as bicicletas em Lisboa". Nada mais estranho, sabendo-se ainda para mais que essa "nova estratégia" surgiria, imagine-se, após uma reunião entre associações de ciclistas com os dois Vereadores que têm trabalhado os assuntos relativos à bicicleta. 
Basicamente, a CML, que implementa desde 2007 uma rede ciclável, tendo conseguido o feito de conseguir que, de forma decisiva, a bicicleta se tenha instalado substancialmente na Cidade, ligando inumeros espaços verdes existentes e construidos, bem como diversos equipamentos colectivos e interfaces, e gerando uma alteração de fundo na percepção que a Cidade e os Lisboetas têm das possibilidades reais da bicicleta como ferramenta de mobilidade, de repente, após uma reunião, decidia que iria mudar de estratégia?
Mas alguém acredita nisso?
Sem querer tirar demasiado partido do facto de ter estado na referida reunião, registei com alguma surpresa um Comunicado sobre a mesma, sem que os referidos Vereadores tivessem sido convidados a juntarem-se a um memorando sobre o que realmente teria sido discutido. As Associações pura e simplesmente lançaram o comunicado, informando ao mundo de que a CML, após uma reuião, teria mudado a sua estratégia, de anos, para as bicicletas. De facto, as estratégias não têm que ser imutáveis, mas convinhamos que não seria nunca numa reunião que a mesma seria alterada. E se por acaso o fosse, concerteza que os representantes do Município dariam, eles próprios, essa notícia. 
Teriamos sido, portanto, informados por terceiros.
Mas este assunto é mais claro e simples do que o que parece:
A estratégia para a bicicleta desde 2007 foi sempre pensada como tendo 2 momentos: Um primeiro momento de arranque, onde o "Plano Verde" e os corredores verdes são o motivo principal para o delinear de trajectos. A segregação foi largamente feita em espaço retirado ao automóvel (no período 2007-2013, apenas 12% será em espaço misto anteriormente pedonal), mesmo que esse espaço tenha sido em alguns casos nivelado à altura do passeio. Foram feitas ligações contínuas, atractivas e seguras entre pontos potencialmente atractivos da Cidade, optando-se por procurar  áreas planas da Cidade, bem como implementar pontes ciclopedonais sobre barreiras físicas e para resolver questões de declive.
Ao contrário do que é dito na notícia, os resultados têm sido satisfatórios. Pelo menos para a generalidade dos utilizadores que usam as infra-estruturas e que são substancialmente novos utilizadores. Os objectivos estão a ser largamente cumpridos e na infra-estrutura já executada não se prevê mais do que correcções pontuais de alguns ressaltos e um ou outro ponto já detectado.
Esta estratégia, nada inovadora em cidades ditas "principiantes" como refere o gráfico do projecto "PRESTO", vai-se ajustando à medida que as infra-estruturas são implementadas. Lisboa não tinha ciclistas e agora já tem. Ainda pouco significativo no que respeita à repartição modal, é certo, mas cada vez mais. 
Há muito que se prevê a sobreposição desta estratégia "verde" com uma outra de consolidação, que na verdade já está a acontecer há tempo, parecendo pela leitura do comunicado que os signatários só agora se deram conta disso, na reunião.
Esta natural sobreposição de uma "rede verde" que estruturou a primeira rede com uma segunda que se ramifica nas Ruas e Avenidas, quer através de segregação, quer através de "Zonas 30", menos desde 2010 que está abertamente em curso. E desde essa altura que é  divulgada pela CML em eventos, fóruns e nos seus documentos oficiais.
Quer no Velo-City de Sevilha em 2011, quer em Copenhaga no Comité das Regiões, onde a CML vou a Rede Ciclável escolhida como projecto relevante, esta questão foi igualmente amplamente discutida. Mas foi também durante todo o processo de Revisão do PDM e em inúmeros documentos e fóruns públicos. 

A maioria dos documentos de referência é claro: Cidades sem bicicletas têm uma abordagem diferenciada de outras com contextos sedimentados de cultura da bicicleta.
Cabe às Associações saberem gerir os momentos e a forma de participação neste processo. Boa parte do comunicado que foi lançado não informa adequadamente o público e torna esta questão aparentemente volátil. 
Mas a estratégia já delineada é para implementar e aquilo que foi combinado com as Associações de Ciclistas na reunião será, no referido âmbito, para ser cumprida. 

8 comentários:

  1. Quer dizer, o Duarte descobriu agora que as associações são independentes, que têm vontade própria? Eu percebo, não estava habituado...

    Depois, muitos parabéns por tentar explicar a estratégia que "vem de lá longe". Há 10 anos que ando a tentar percebê-la.

    Bolas, que ainda não foi desta!



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  2. Não é nada disso que trata o post...!
    mas o João tem a sua vontade própria", não vai querer perceber...

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  3. Bom, começa por manifestar surpresa por esta posição das associações, daí o comentário. Eu explico melhor: a surpresa em ver finalmente a CML a assinar por baixo de alguns princípios básicos que nunca deveriam ter sido ignorados é tanta, que é mesmo de espalhar a boa nova!

    Mas vamos então ao tópico: tendo a estratégia os seus méritos, concorde-se ou não com ela, já a defesa da sua implementação é muito discutível: começando nas ciclovias "seguras" para os iniciantes (que mal o deixam de ser as abandonam - o Duarte já se perguntou porquê?) e acabando no suposto empenho, desde 2010, da CML em implementar medidas de acalmia de tráfego. Acredito que nos powerpoints isso fique muito bem e dê um grande brilho ao trabalho de gabinete, mas quem anda na rua tem outra perspectiva completamente diferente.
    Adorava um dia dar uma volta por Lisboa numa destas ciclovias que ligam as coisas umas às outras com o Duarte e Co. A ver se continuava a falar de "ligações contínuas, atractivas e seguras"...mas será que tem vontade de perceber?

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  4. Olá Duarte,

    Surpreende-me a parte do teu post que está directamente relacionada com o comunicado das 3 associações e com o que foi discutido na reunião que o mesmo cita, porque dás a entender que nada do que a CML assumiu na reunião com as 3 associações implica mudança nas práticas da CML.

    Passo a explicar porque discordo.

    O comunicado afirma que a CML acordou em 4 princípios, e passo a citar:
    1) Ponderar seriamente a redução da quantidade e velocidade dos automóveis nas ruas e bairros de Lisboa, antes de decidir pela segregação da bicicleta;
    2) As ciclovias devem ter um só sentido de circulação, para evitar conflitos perigosos nos cruzamentos;
    3) As ciclovias não devem ser construídas sobre os passeios, para evitar conflitos com os peões;
    4) As ciclovias devem ser contínuas e cruzar em segurança vias de tráfego automóvel intenso.

    Estou certo que concordarás que a CML nem sempre tem pautado, até ao momento, a sua actuação por estes princípios.
    Para não fazer uma acusação infundada, pego num dos exemplos mais recentes de ciclovias que a CML implementou, a ciclovia na Av. Frei Miguel Contreras: a ciclovia foi construída ao longo de avenida com baixa intensidade/velocidade de tráfego automóvel (logo viola princípio 1), bidireccional (viola princípio 2), sobre o passio (viola princíio 3), intersecta saídas da estação de comboios com alto fluxo pedonal, criando perigosos pontos de conflito com peões (viola princípio 4).

    Se a prática da CML até ao momento não seguia os 4 princípios acima e se na reunião perante as 3 associações a CML assumiu os 4 princípios acima, parece-me indiscutível que *a CML assumiu uma mudança na sua estratégia* - mudança essa que as 3 associações aplaudem.

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  5. Eu mostro supresa pela posição das Associações? Não, eu mostro surpresa pelo título do artigo que não corresponde ao que foi realmente dito na reunião. Mostro surpresa pelas Associações terem feito um comunicado no final de uma reunião sem terem tido a simpatia de perguntar, como é habitual nestes casos, se o mesmo não deveria basear-se um memorando de uma reunião, vinculado pelos presentes.
    A estratégia é de facto a que aqui lhe conto e que, na prática, tem sido implementada e continuará, na mesma, a ser, nos exactos moldes em que foi comunicada às Associações na reunião. Não são as ciclovias para iniciantes, esta estratégia é que é o de uma cidade "iniciante". Isso mesmo é sugerido por inúmeros documentos e especialistas. Os resultados estão à vista, e recomendam-se. Lisboa já está a ser requisitada até para falar dos seus sucessos lá fora e acredite que também a este nível haverá mais boas surpresas este ano. Por mim é tudo. Cumprimentos

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  6. "Os resultados estão à vista e recomendam-se"
    Se a métrica para avaliar o sucesso desta estratégia é a sua apresentação em simpósios e avaliações de especialistas, acredito que sim. Já se olharmos pelo lado dos utilizadores, tenho grandes dúvidas, como de resto ando a dizer há anos. Mas disso o Duarte prefere sempre não falar e encontra sempre alguma desculpa. Está no seu direito. Não me parece é que seja muito lógico que na sequência se venha queixar de falta de tacto da parte das associações de utentes do espaço público: a CML não tem primado pela diplomacia ou respeito pelas opiniões doa utilizadores. Mas sim, esperemos que bons tempos se avizinham. Cumprimentos e força no pedal!

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  7. A métrica são talvez as opiniões de uma minoria de ciclistas...mas se você o diz há anos, então é porque tem concerteza toda a razão.
    Eu cá não percebo nada destes assuntos. Cumprimentos

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  8. Não Duarte, a métrica não são as opiniões de uma minoria de utilizadores. Quais são então? São as opiniões de "especialistas"? Quais? Por exemplo, a CML já se deu ao trabalho de fazer contagens de tráfego em vias com e sem ciclovias? Inquéritos aos utilizadores? É que eu tenho muitos testemunhos de gente que abandona as vias segregadas nos passeios porque elas não servem para o seu commuting diário, daí a insistência em achar a estratégia coxa.
    Registo a habitual sobranceria com que trata as opiniões dissonantes. Que diabos, eu e muitos outros nunca deixaram de reconhecer o trabalho pioneiro da CML (não só neste executivo, diga-se em abono da verdade, mas sobretudo, sim) na popularização da bicicleta em Lisboa. E mais, a sua equipa terá tido feedback das obras que fez como muito poucos autarcas terão do trabalho que fazem. Porque há interesse em que as coisas se façam bem, para haver boas condições para os modos activos em Lisboa.
    Mas o Duarte prefere escudar-se em teorias de "cidades principiantes" para justificar a repetição de erros técnicos de projecto e/ou execução, ignorando alertas e contributos vários, à borla e a tempo e horas, para evitar a perpetuação desses erros. Isso não é sério, e não ajuda nada para que haja confiança de parte a parte. Espero sinceramente que esta reunião da notícia seja um prenúncio de que algo vai mudar na postura da CML, que não seja só para Inglês ver. O resto é conversa. Obrigado pelo tempo e bom resto de fim de semana.

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